quarta-feira, 30 de agosto de 2017

REPÚBLICA DOS BRUZUNDANGAS


REPÚBLICA DOS BRUZUNDANGAS
Celso de Lanteuil
Porto, 3 de abril de 2017


Em homenagem ao amigo Josil Deslandes, que me presenteou com este precioso livro e me apresentou ao inteligente Lima Barreto, autor de Os Bruzundangas (Ed. Garnier, 1988, obra originalmente editada em 1923, por Jacintho Ribeiro  dos Santos).
 
A República dos Bruzundangas é o país das Trapalhadas. Um país cheio de vícios e cacoetes, confuso, afônico, sem rumo, que segue asfixiado e asfixiando pessoas e sonhos.
 
Um país que perde o ar para aqueles senhores que costumam gritar do alto da sacada, como se mandachuva fossem, e para o senhor “conselheiro”, que é o assessor do adjunto do subchefe, aquele que nos põe a correr atrás de um sonho que não conseguimos entender, um qualquer acostumado a dar ordens e sorrir.
 
Mas, se nessa terra falta a boa semente da cidadania, também floresce a mente daninha, que sorrateira cresce criando filhotes aos tantos. São os trapalhões da ordem e do progresso, que de branco, azul, verde e amarelo, nada tem. São os que só dizem amém para fazer o próprio bem e nos deixam os aborrecimentos, o esforço e as dores.
 
A República dos Bruzundangas é amável, dócil e solidária, nas aparências. Lá se diz I love you, Apareça para o jantar, Você faz a diferença, mas na primeira esquina que se dobra, já podemos ouvir Ele não passa de uma fraude, Aquele não vale o sapato que calça!
 
Os Bruzundangas são assim, essa mistura exótica que costuma se alimentar com uma fome de mil dias. Eles devoram tudo o que veem. Batata, habitação, terra, ouro, emoção, água, lágrima, oração e sorriem de barriga cheia, na frente daqueles que sonham com um pedaço de pão.
 
Os Bruzundangas são mesmo autênticos, são da família, da paróquia, unidos sempre na alegria, na celebração e na vitória, e se proliferam de mansinho, sem se fazer notar. São eles que se permitem ser o que são, somente eles. Contudo, quando na derrota do vizinho, ou na dor de um amigo e na perda do emprego de um colega de repartição, bem, aí é uma outra história…
 
 

 

6 comentários:

  1. falta educação, sinto que só se resolve com educação e honestidade...sem estas não se vive em harmonia, nada prospera de verdade...

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    1. Estamos de acordo. Educação, educação, educação... A República de Bruzundanga é mesmo um caso muito complexo.

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    2. Celso, li o texto e os comentarios. São iguais de todos os ângulos. Já tivemos, desde 1889, 36 presidentes em 38 legislaturas, 18 deles foram eleitos, mais de 1800 senadores e mais de 50 mil deputados e nenhum deles apresentou uma solução. Vc escreveu "educação" como solução. Em 132 anos de república, vc que lê muito e escreve muito bem, sempre lhe falei isso, responda então, prezado amigo; onde falhou a educação? Como escreveu Belchior e eternizado na voz de Elis Regina:
      "Minha dor é perceber
      Que apesar de termos
      Feito tudo o que fizemos
      Ainda somos os mesmos
      E vivemos
      Ainda somos os mesmos
      E vivemos
      Como os nossos pais".

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    3. Obrigado, "Solução", pela suas ótimas observações. O Brasil é um mistério imenso e de fato, me parece, não existem soluções simples. Numa primeira análise, enxergo uma característica histórica que estrutura essa nossa maneira de caminhar, onde poucos controlam o modo de ser e viver de muitos. Penso que temos um povo que foi sempre controlado e impedido por inúmeras vias práticas e institucionais, de abraçar a sua verdadeira independência. Insisto na educação pública universal, pois apesar das tradicionais discussões ao redor daquilo que poderia ser a melhor escolha currícular, a educação continua tendo a função de libertar o pensamento e de nos impulsionar para a vida munidos de melhores recursos intelectuais, sociais e emocionais. Ela aparelha o ser humano, para melhor utilizar suas capacidades na hora de buscar as melhores soluções para os problemas que ele tem diante de si. A educação nos permite enxergar além e isso não interessa a muita gente.

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  2. Infelizmente esse é o retrato da nossa republica dos Bruzundangas.
    Bom texto, é preciso refletir.

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    1. É verdade. Uma República com tantas diversidades, precisa de muitos a trabalhar, para que esse processo de falência moral seja freado. Nada é simples em Bruzundanga...

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